Nota técnica nº 03/2024 – Registro de Imóveis do Brasil

Assunto: Procedimento da execução extrajudicial do crédito hipotecário à luz das atualizações promovidas pela Lei Federal nº 14.711/2023 (Novo Marco das Garantias).

Elaboração: Bernardo Chezzi (assessor jurídico do RIB), Christian Lunardi Favero (SC), Eduardo Arruda Schroeder (SC), Hermano Soar (SC), José Paulo Baltazar Junior (MS) e Sergio Cupolino (SC). Nota aprovada pelo Conselho de Administração do Registro de Imóveis do Brasil.

  1. Contextualização

A Lei Federal nº 14.711/2023 (Novo Marco das Garantias) nasceu com a proposta de aperfeiçoar, diversificar e simplificar os procedimentos de constituição e execução das garantias reais, de modo a fomentar a expansão e o acesso ao crédito no país. Nesse cenário de evolução, a lei disciplinou, no art. 9º, o processo extrajudicial de execução dos créditos garantidos por hipoteca, expandindo seu escopo de aplicação para além dos casos previstos no Decreto-Lei nº 70/1966. A nova forma processual de excussão da garantia hipotecária é mais uma ferramenta de fortalecimento do fenômeno da extrajudicialização, delegando-se aos serviços registrais1 a atribuição de conduzir a formalização de atos declaratórios, constitutivos e executórios. Com as alterações propostas pela nova lei, surge a necessidade de o Registro de Imóveis do Brasil (RIB), enquanto associação responsável por fomentar, aprimorar e modernizar os serviços prestados pelos oficiais de registro, emitir nota padronizadora sobre essa inovação processual. A presente nota técnica, portanto, tem como objetivo uniformizar o processo da execução extrajudicial em âmbito nacional, contribuindo para o melhor ambiente de negócios. Para melhor aproveitamento do texto, indica-se a leitura da Nota Técnica nº 04/20232 , que trata dos novos atos registrais previstos na Lei nº 14.711/2023, e da Nota Técnica n° 01/20243 , que aborda a intertemporalidade da lei.

  • Considerações preliminares

A viabilidade da execução do crédito hipotecário perante o Registro de Imóveis depende de previsão expressa da adoção do rito extrajudicial, no instrumento constitutivo da garantia, inclusive como requisito de validade desse processo.

1 Sob a supervisão e fiscalização do Poder Judiciário, conforme arts. 37 e 38, da Lei nº 8.935/94 e art. 236, §1º, da Constituição Federal.

2 https://www.registrodeimoveis.org.br/nota-tecnica-novos-atos-registrais-na-lei-14711-2023

3 https://www.registrodeimoveis.org.br/lei-14711-2023 2

A exigência é uma inovação da Lei n. 14.711/23, não encontrada nos arts. 29 a 414 , Capítulo III, do Decreto-Lei nº 70/1966, que regulava a execução extrajudicial da garantia hipotecária no âmbito do sistema financeiro nacional.

O Novo Marco das Garantias revogou5 os citados artigos do Decreto-Lei n° 70/1966, substituindo-os por uma legislação mais moderna, com grau de semelhança ao rito da excussão extrajudicial da alienação fiduciária de bens imóveis.

Com as modificações introduzidas pela nova legislação, emergem três premissas para se concluir pela viabilidade, ou não, da execução extrajudicial da garantia hipotecária:

Títulos formados antes da Lei nº 14.711/2023 A execução extrajudicial será possível mediante a celebração de um aditivo que expressamente autorize o manejo desta via, com a consequente averbação deste aditivo na matrícula do imóvel, por força do disposto no § 15, artigo 9º:

Art. 9º Os créditos garantidos por hipoteca poderão ser executados extrajudicialmente na forma prevista neste artigo. […]

§ 15. O título constitutivo da hipoteca deverá conter, sem prejuízo dos requisitos de forma do art. 108 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), ou da lei especial, conforme o caso, como requisito de validade, expressa previsão do procedimento previsto neste artigo, com menção ao teor dos §§ 1º a 10 deste artigo.

O princípio aqui é evitar a surpresa do devedor na execução do crédito de forma extrajudicial. O aditivo poderá ser celebrado por instrumento particular se o contrato principal puder ser assim celebrado, atendendo aos requisitos legais6 .

II. Títulos formados antes do advento da Lei nº 14.711/2023, mas regidos pelo Decreto-Lei nº 70/1966 a execução extrajudicial será regulada pelo novo procedimento (art. 9º, da Lei nº 14.711/23), preservando-se os atos processuais já praticados (ex vi art. 14, do CPC7 ).

III. Títulos formados após o advento da Lei nº 14.711/2023 A execução extrajudicial será regulada integralmente pelo art. 9º da Lei nº 14.711/23. Uma vez avaliada a situação em que a garantia hipotecária está inserida, adequando-a, se necessário, à nova legislação, viável a execução pela via extrajudicial.

4 Em relação aos títulos constituídos nas demais situações não abarcadas pelo aludido Decreto-Lei, a execução só era viável pela via judicial.

5 Art. 18. Ficam revogados: I – o Capítulo III do Decreto-Lei nº 70, de 21 de novembro de 1966;

6 Art. 104, III, combinado com art. 108, do Código Civil; art. 221, II e § 5º, da Lei nº 6.015/73; art. 61, § 5º, da Lei nº 4.380/1964; art. 38, da Lei nº 9.514/1997; art. 26 do Decreto-Lei nº 70/1966; art. 45, parágrafo único, da Lei nº 11.795/2008; instrumentos da Lei nº 10.931/2004; e qualquer outra norma específica.

7 Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. 3

  • Execução extrajudicial da garantia hipotecária O processo para execução extrajudicial da garantia hipotecária pode ser iniciado pelo primeiro credor8 , seu cessionário ou agente de garantia9 , mediante requerimento protocolado no Registro de Imóveis da situação do imóvel, nos termos art. 9º, § 1º, da Lei nº 14.711/2023:

Art. 9º (…)

§ 1º. Vencida e não paga a dívida hipotecária, no todo ou em parte, o devedor e, se for o caso, o terceiro hipotecante ou seus representantes legais ou procuradores regularmente constituídos serão intimados pessoalmente, a requerimento do credor ou do seu cessionário, pelo oficial do registro de imóveis da situação do imóvel hipotecado, para purgação da mora no prazo de 15 (quinze) dias, observado o disposto no art. 26 da Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, no que couber.

Enquanto não houver regulamentação específica, recomenda-se que o requerimento apresentado para iniciar o processo de execução contenha e/ou seja instruído com:

• Número do CPF ou CNPJ e nome do credor hipotecário, dispensada a indicação de outros dados qualificativos;

• Número do CPF ou CNPJ e nome do devedor e do terceiro hipotecante, se o caso, dispensada a indicação de outros dados qualificativos;

• Endereços do(s) devedor(es) ou garantidor(es), residencial e/ou comercial, o que houver;

• Endereço eletrônico, do(s) devedor(es) ou garantidor(es), se houver;

• Declaração de que decorreu o prazo de carência;

• Demonstrativo do débito10 e projeção de valores para pagamento da dívida, ou do valor total a ser pago pelo devedor por períodos de vencimento;

• Comprovante de representação legal do credor hipotecário pelo signatário do requerimento, quando for o caso.

O requerimento é o instrumento hábil para prenotação do início da execução extrajudicial, pelo que o registrador precisa lançá-lo no controle geral de títulos contraditórios e realizar a qualificação, respeitadas as diretrizes da Lei nº 6.015/1973.

Por ser um processo extrajudicial, sugere-se que seja feita autuação, formando um único expediente para todos os atos da execução extrajudicial, ainda que tenha por objeto mais de um imóvel11 .

8Código Civil, Art. 1.477. Salvo o caso de insolvência do devedor, o credor da segunda hipoteca, embora vencida, não poderá executar o imóvel antes de vencida a primeira.

9 Código Civil: Art. 853-A. Qualquer garantia poderá ser constituída, levada a registro, gerida e ter a sua execução pleiteada por agente de garantia, que será designado pelos credores da obrigação garantida para esse fim e atuará em nome próprio e em benefício dos credores, inclusive em ações judiciais que envolvam discussões sobre a existência, a validade ou a eficácia do ato jurídico do crédito garantido, vedada qualquer cláusula que afaste essa regra em desfavor do devedor ou, se for o caso, do terceiro prestador da garantia.

10 Pelo art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/1997, o débito é composto pelas parcelas vencidas e as que vencerem até o pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os encargos contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel e as despesas de cobrança e de intimação.

11 Por força da parte final do § 1º do art. 9º, da Lei nº 14.711/2023, a regra atinente às situações envolvendo alienação fiduciária garantida por mais de um imóvel se aplica ao procedimento da execução hipotecária (art. 26, § 1º A, da Lei nº 9.514/1997). 4

Com vistas a garantir a manutenção dos efeitos jurídicos da prenotação12 , esta precisa ser postergada até a finalização do processo de execução extrajudicial. Contudo, existe a necessidade de avaliação se poderá esta prenotação ser cancelada antes, nos casos de inércia do credor que se omitir em satisfazer eventuais exigências do registrador, quando da qualificação registral negativa1314 .

A Lei nº 14.711/2023 não estabeleceu um prazo para cancelamento da prenotação por desídia do credor. Caso as normas da corregedoria estadual também não tragam previsões desse cancelamento, poderá ser consultado o Tribunal de Justiça a respeito da possibilidade de regulamentação, podendo ser sugerido como parâmetro normativo, por analogia, o prazo previsto para o cancelamento da prenotação no caso de não consolidação da propriedade na alienação fiduciária.

Na hipótese de o título ser qualificado positivamente, serão iniciadas as próximas fases do processo de excussão extrajudicial da garantia hipotecária.

Importante pontuar que a Lei nº 14.711/2023 não previu qualquer tipo de impugnação extrajudicial por parte do devedor ou garantidor, de modo que, iniciado o processo de execução, estando o credor diligente no processo, este só poderá ser interrompido ou suspenso por determinação judicial.

3.1. Fase de intimação

  1. Conteúdo da intimação

Nesta fase, o registrador de imóveis emitirá uma intimação destinada ao devedor e, se for o caso, também ao terceiro hipotecante, para que purgue a mora no prazo de 15 dias. No silêncio das normas de serviço locais ou normas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), recomenda-se que a intimação contemple:

• Os dados relativos ao imóvel e ao título da hipoteca;

• O demonstrativo do débito; • A indicação dos valores correspondentes às despesas de cobrança e de intimação;

• A informação de que o pagamento poderá ser efetuado perante o Registro de Imóveis, consignando-se o seu endereço, dias e horários de funcionamento, ou diretamente perante o credor;

• A advertência de que o pagamento deverá ser feito no prazo improrrogável de 15 dias, contado da data do recebimento da intimação;

• A advertência de que o não pagamento enseja o início do processo de excussão da garantia hipotecária por meio de leilão público, nos termos do § 2º, do art. 9º, da Lei nº 14.711/2023.

12 Lei nº 6.015/1973, art. 205; “Cessarão automaticamente os efeitos da prenotação se, decorridos 20 (vinte) dias da data do seu lançamento no Protocolo, o título não tiver sido registrado por omissão do interessado em atender às exigências legais”.

13 “A fase de qualificação, que se interpõe entre o protocolo e o registro do título, compreende o exame dos caracteres extrínsecos do documento e a observância dos princípios registrais” (LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros Públicos – Teoria e Prática / Luiz Guilherme Loureiro – 12.ed., ver., atual. e ampl. – São Paulo: Editora JusPodvm, 2023).

14 Lei nº 6.015/1973, art. 198: “Se houver exigência a ser satisfeita, ela será indicada pelo oficial por escrito, dentro do prazo previsto no art. 188 desta Lei e de uma só vez, articuladamente, de forma clara e objetiva, com data, identificação e assinatura do oficial ou preposto responsável, para que: (…)” 5

  • Formas de efetivar a intimação

O legislador, como forma de semelhar o procedimento à execução extrajudicial da alienação fiduciária, fixou que as regras atinentes à essa fase deverão observar o art. 26 da Lei nº 9.514/1997. Diante disso, a intimação será procedida pelos meios ordinários previstos no § 3º15 e no § 4º-B do art. 26 da Lei nº 9.514/1997:

• Pelo oficial de Registro de Imóveis;

• Por oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la;

• Por Correios, com aviso de recebimento; e • Ao endereço eletrônico informado no contrato.

  • Intimação por hora certa Nos casos em que o agente responsável pela diligência de entrega da intimação suspeite, de forma motivada, que o devedor ou, se for o caso, terceiro hipotecante, está se ocultando, deverá certificar o fato para viabilizar a intimação por hora certa16 .


Efetivada a notificação por hora certa, caberá ao oficial de Registro de Imóveis encaminhar carta dando ciência ao devedor ou, se for o caso, o terceiro hipotecante de tudo que consta no processo17, passando a fluir o prazo de 15 dias para purgação da mora.

  • Intimação por edital

Na hipótese de o agente responsável pela diligência de entrega da intimação constatar que o destinatário está em local ignorado18, incerto ou inacessível19, poderá ser realizada a intimação editalícia20 . A intimação por edital pode ocorrer por meio eletrônico, facilitando a publicação e com um custo mais acessível do que a publicação tradicional21 .

15 “Art. 26 (…)

§ 3º A intimação será feita pessoalmente ao devedor e, se for o caso, ao terceiro fiduciante, que por esse ato serão cientificados de que, se a mora não for purgada no prazo legal, a propriedade será consolidada no patrimônio do credor e o imóvel será levado a leilão nos termos dos arts. 26-A, 27 e 27-A desta Lei, conforme o caso, hipótese em que a intimação poderá ser promovida por solicitação do oficial do registro de imóveis, por oficial de registro de títulos e documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento, situação em que se aplica, no que couber, o disposto no art. 160 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei de Registros Públicos)”. (…)

§ 4º-B Presume-se que o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante encontram-se em lugar ignorado quando não forem encontrados no local do imóvel dado em garantia nem no endereço que tenham fornecido por último, observado que, na hipótese de o devedor ter fornecido contato eletrônico no contrato, é imprescindível o envio da intimação por essa via com, no mínimo, 15 (quinze) dias de antecedência da realização de intimação edilícia”.

16 Lei nº 9.514/1997, art. 26, §3º-A: “Quando, por duas vezes, o oficial de registro de imóveis ou de registro de títulos e documentos ou o serventuário por eles credenciado houver procurado o intimando em seu domicílio ou residência sem o encontrar, deverá, havendo suspeita motivada de ocultação, intimar qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho de que, no dia útil imediato, retornará ao imóvel, a fim de efetuar a intimação, na hora que designar, aplicando-se subsidiariamente o disposto nos arts. 252, 253 e 254 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil)”.

17 CPC, art. 254: “Feita a citação com hora certa, o escrivão ou chefe de secretaria enviará ao réu, executado ou interessado, no prazo de 10 (dez) dias, contado da data da juntada do mandado aos autos, carta, telegrama ou correspondência eletrônica, dando-lhe de tudo ciência”.

18 Art. 26, §4º-B, da Lei nº 9.514/1997: “quando não encontrados no local do imóvel dado em garantia nem no endereço que tenham fornecido por último”. 19 Art. 26, §4º-C, da Lei nº 9.514/1997: “quando o funcionário responsável pelo recebimento de correspondência se recuse a atender ou quando não exista o funcionário em questão”.

20 Considerar-se-á em lugar ignorado o devedor e, se for o caso, terceiro hipotecante que deixar de informar ao credor fiduciário sobre a alteração de seu domicílio, não podendo, nesse sentido, ser alegada nulidade de intimação (ex vi do § 4ºA, do art. 26, da Lei nº 9.514/1997).

21 https://www.registrodeimoveis.org.br/nota-tecnica-editais-alienacao-fiduciaria  6

Aplica-se, de forma análoga, a regra consagrada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de que todos os endereços devem ser diligenciados

22 para que seja considerado em local incerto e não sabido, autorizadores de expedição de intimação editalícia.

Aplica-se aqui, também, a necessidade de tentativa de intimação por endereço eletrônico (e-mail) antes da publicação dos editais.

e) Purga da mora ou averbação de início da execução Uma vez procedida a intimação, o devedor poderá purgar a mora, convalescendo o contrato de hipoteca23, ou se manter inerte, o que dará ensejo ao início da excussão extrajudicial, averbando-se na matrícula do imóvel tal circunstância24, a requerimento do credor25 .

3.2. Fase de Leilões Públicos

a) Prazo para promover o leilão Averbado o início do processo de excussão extrajudicial da garantia hipotecária, o credor terá o prazo de 60 dias para promover leilão público do imóvel hipotecado26 , devendo promover a comunicação ao devedor e, se for o caso, ao terceiro fiduciante, sobre as datas, os horários e os locais dos leilões27 .

b) Remissão da dívida Essa comunicação tem como fundamento a viabilização da remissão da dívida pelo devedor (ou pelo terceiro hipotecante) antes da alienação do bem em leilão. O devedor (ou o garantidor) poderá realizar o pagamento da dívida diretamente no Registro de Imóveis, que, no prazo de três dias28 , realizará o repasse ao credor, averbando o cancelamento da execução hipotecária na(s) matrícula(s).

22 PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ANULATÓRIA DE CONSOLIDAÇÃO DE PROPRIEDADE E DE LEILÕES EXTRAJUDICIAIS. CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO, COM PACTO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR. PURGAÇÃO DA MORA. REALIZAÇÃO DO LEILÃO JUDICIAL. EDITAL. ESGOTAMENTO DE TODOS OS MEIOS. AUSÊNCIA. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. 1. Ação anulatória de consolidação de propriedade e de leilões extrajudiciais fundada em contrato de financiamento imobiliário, com pacto de alienação fiduciária. 2. O reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível. 3. A intimação por edital para fins de purgação da mora no procedimento de alienação fiduciária de coisa imóvel pressupõe o esgotamento de todas as possibilidades de localização do devedor. Precedentes. 4. No contrato de alienação fiduciária de bem imóvel, regido pela Lei nº 9.514/1997, é necessária a intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial, ainda que tenha sido previamente intimado para purgação da mora. Precedentes. 5. Agravo interno no agravo em recurso especial não provido. (STJ – AgInt no AREsp: 2276046 RJ 2023/0003836-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 19/06/2023, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/06/2023)

23 Art. 26, § 5º, da Lei nº 9.514/1997: “§ 5º Purgada a mora no Registro de Imóveis, convalescerá o contrato de alienação fiduciária”.

24 Lei nº 14.711/2023. “Art. 9 (…). § 2º A não purgação da mora no prazo estabelecido no § 1º deste artigo autoriza o início do procedimento de excussão extrajudicial da garantia hipotecária por meio de leilão público, e o fato será previamente averbado na matrícula do imóvel, a partir do pedido formulado pelo credor, nos 15 (quinze) dias seguintes ao término do prazo estabelecido para a purgação da mora”. 2

5 Em respeito ao princípio da instância, previsto no art. 13, II, da LRP.

26 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 3º: “No prazo de 60 (sessenta) dias, contado da averbação de que trata o § 2º deste artigo, o credor promoverá leilão público do imóvel hipotecado, que poderá ser realizado por meio eletrônico”.

27 Lei n° 14.711/2023, art. 9º, § 4º: “Para fins do disposto no § 3º deste artigo, as datas, os horários e os locais dos leilões serão comunicados ao devedor e, se for o caso, ao terceiro hipotecante por meio de correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato ou posteriormente fornecidos, inclusive ao endereço eletrônico”.

28 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 7º: “Antes de o bem ser alienado em leilão, é assegurado ao devedor ou, se for o caso, ao prestador da garantia hipotecária o direito de remir a execução, mediante o pagamento da totalidade da dívida, cujo valor será acrescido das despesas relativas ao procedimento de cobrança e leilões, autorizado o oficial de registro de imóveis a receber e a transferir as quantias correspondentes ao credor no prazo de 3 (três) dias”.

7 Salvo disposição contrária nas normas administrativas ou nas leis de emolumentos, cada averbação de cancelamento do processo de execução é considerada um ato sem conteúdo econômico. O registrador pode exigir o prévio pagamento dos emolumentos ao devedor ou ao terceiro hipotecante, caso seja remida a dívida perante a serventia, ou diretamente ao credor, caso este comunique ao Registro de Imóveis o adimplemento da dívida, solicitando a averbação de encerramento da execução.

c) Lances nos leilões

No dia agendado, o credor promoverá o primeiro leilão público do bem imóvel, não podendo ser aceito lance inferior ao valor do imóvel ou ao da avaliação feita para cobrança do imposto de transmissão – o que for maior. Caso o primeiro leilão seja negativo, o credor promoverá o segundo leilão nos 15 dias seguintes29 .

No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor integral da dívida garantida pela hipoteca e das demais despesas30 . O credor pode, a seu exclusivo critério, aceitar um lance que corresponda à metade do valor de avaliação do bem31 .

Não cabe ao registrador realizar o controle desses prazos, nem dos lances referentes aos leilões, sendo tal incumbência legalmente imposta ao credor hipotecário e ao leiloeiro, profissional habilitado, registrado na Junta Comercial para realizar a função32 .

Havendo lance vencedor, os autos do processo de execução extrajudicial da hipoteca serão encaminhados ao tabelião de Notas, com circunscrição que abranja o local do imóvel, para lavratura de ata notarial de arrematação, que constituirá título hábil de transmissão da propriedade ao arrematante, a ser registrado na matrícula do imóvel33 .

Deverá ser comprovado o recolhimento do imposto de transmissão, e, se for o caso, do laudêmio34 .

Os emolumentos serão cobrados como registro com valor econômico, por se tratar de um ato de transferência do imóvel.

29 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 5º: “Na hipótese de o lance oferecido no primeiro leilão público não ser igual ou superior ao valor do imóvel estabelecido no contrato para fins de excussão ou ao valor de avaliação realizada pelo órgão público competente para cálculo do imposto sobre transmissão inter vivos, o que for maior, o segundo leilão será realizado nos 15 (quinze) dias seguintes”.

30 No caso de lance que supere o valor da totalidade da dívida e despesas, deverá o credor, no prazo de 15 dias, entregar o excedente ao hipotecante, contado do pagamento do preço da arrematação, nos termos da Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 8º.

31 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 6º: No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que seja igual ou superior ao valor integral da dívida garantida pela hipoteca, das despesas, inclusive emolumentos cartorários, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais, podendo, caso não haja lance que alcance referido valor, ser aceito pelo credor hipotecário, a seu exclusivo critério, lance que corresponda a, pelo menos, metade do valor de avaliação do bem.

32 Conforme disposições do Decreto nº 21.981/1932.

33 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 11: “Concluído o procedimento e havendo lance vencedor, os autos do leilão e o processo de execução extrajudicial da hipoteca serão distribuídos a tabelião de notas com circunscrição delegada que abranja o local do imóvel para lavratura de ata notarial de arrematação, que conterá os dados da intimação do devedor e do garantidor e dos autos do leilão e constituirá título hábil de transmissão da propriedade ao arrematante a ser registrado na matrícula do imóvel.”

34 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 14: “Em quaisquer das hipóteses de arrematação, venda privada ou adjudicação, deverá ser previamente apresentado ao registro imobiliário o comprovante de pagamento do imposto sobre transmissão inter vivos e, se for o caso, do laudêmio”. 8

  • Leilões negativos

Caso o referencial mínimo não seja atingido no segundo leilão, poderá o credor se apropriar do imóvel em pagamento da dívida35 ou realizar, no prazo de 180 dias, a venda direta do bem a terceiro36 .

• Caso o credor opte pela apropriação do bem, precisará formalizar sua opção com a apresentação do requerimento ao Registro de Imóveis, que fará o registro da transmissão de propriedade ao credor na(s) matrícula(s) do(s) imóvel(is), indicando, no texto do registro, o resultado dos leilões negativos e o exercício do direito do credor, nos moldes do art. 9º, § 9º, inciso II, da Lei nº 14.711/2023.

• Caso o credor opte pela venda direta a terceiro, utilizando o mandato legal, a operação deve ser materializada pela lavratura de título hábil37 a registro, o qual deverá ser apresentado ao Registro de Imóveis competente.

Em quaisquer das duas hipóteses, deverá ser comprovado o recolhimento do imposto de transmissão, e, se for o caso, do laudêmio38 .

Em ambos os casos, os emolumentos serão cobrados como um ato de registro com valor econômico para cada matrícula, por se tratar de transferência da propriedade.

• Outras previsões da lei relacionadas à execução extrajudicial da hipoteca, que não têm reflexos diretos em matéria registral: nas operações de financiamento para aquisição ou para construção de imóvel residencial, caso o produto da excussão não seja suficiente para o pagamento da totalidade da dívida e das despesas, o devedor ficará exonerado da responsabilidade pelo saldo remanescente39 . Por fim, aplica-se à execução da hipoteca as regras previstas para alienação fiduciária no que toca à desocupação do ocupante do imóvel, mesmo se houver locação, e à obrigação do fiduciante em arcar com taxa de ocupação e com as despesas vinculadas ao imóvel até desocupação 40 .

35 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 9º, inciso I: “apropriar-se do imóvel em pagamento da dívida, a qualquer tempo, pelo valor correspondente ao referencial mínimo devidamente atualizado, mediante requerimento ao oficial do registro de imóveis competente, que registrará os autos dos leilões negativos com a anotação da transmissão dominial em ato registral único, dispensadas, nessa hipótese, a ata notarial de especialização de que trata este artigo e a obrigação a que se refere o § 8º deste artigo”.

36 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 9º, inciso II: “realizar, no prazo de até 180 (cento e oitenta) dias, contado do último leilão, a venda direta do imóvel a terceiro, por valor não inferior ao referencial mínimo, dispensado novo leilão, hipótese em que o credor hipotecário ficará investido, por força desta Lei, de mandato irrevogável para representar o garantidor hipotecário, com poderes para transmitir domínio, direito, posse e ação, manifestar a responsabilidade do alienante pela evicção e imitir o adquirente na posse”.

37 Escritura pública ou instrumento particular com força de escritura pública, respeitadas as premissas legais (Art. 104, III, combinado com art. 108, do Código Civil; art. 221, II, e § 5º, da Lei nº 6.015/1973; art. 61, § 5º, da Lei nº 4.380/1964; art. 38, da Lei nº 9.514/1997; art. 45, parágrafo único, da Lei nº 11.795/2008).

38 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 14: “Em quaisquer das hipóteses de arrematação, venda privada ou adjudicação, deverá ser previamente apresentado ao registro imobiliário o comprovante de pagamento do imposto sobre transmissão inter vivos e, se for o caso, do laudêmio”.

39 Lei nº 14.711/2023, art. 9º: “§ 10. Nas operações de financiamento para a aquisição ou a construção de imóvel residencial do devedor, excetuadas aquelas compreendidas no sistema de consórcio, caso não seja suficiente o produto da excussão da garantia hipotecária para o pagamento da totalidade da dívida e das demais despesas previstas no § 7º deste artigo, o devedor ficará exonerado da responsabilidade pelo saldo remanescente, hipótese em que não se aplica o disposto no art. 1.430 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil)”.

40 Lei nº 14.711/2023, art. 9º, § 12: “Aplicam-se à execução hipotecária realizada na forma prevista neste artigo as disposições previstas para o caso de execução extrajudicial da alienação fiduciária em garantia sobre imóveis relativamente 9 ***

O Registro de Imóveis brasileiro é um importante ator social para o financiamento com garantias reais no país, conferindo segurança jurídica, agilidade, acessibilidade e transparência às operações.

O Novo Marco das Garantias incrementa o papel do Registro de Imóveis como elemento seguro de condução da recuperação do crédito e instrumento para que mais pessoas tenham acesso à casa própria e mais empresas tenham acesso ao crédito.

O processo extrajudicial dos créditos com garantia hipotecária promovido pela Lei nº 14.711/2023 responde a uma demanda antiga de eficiência processual e segurança jurídica, o que reflete tendências internacionais adaptadas ao contexto brasileiro.

Este documento buscou contribuir com a padronização de entendimento por todos os registradores de imóveis brasileiros, na coalização das entidades estaduais que compõem o RIB, quanto aos aspectos relacionados à execução hipotecária extrajudicial, previstos na Lei nº 14.711/2023.

Ari Pires Neto                                                                           Ricardo Martins

         Presidente do RIB                                                             Presidente do Conselho de

                                                                                             Administração do RIB

à desocupação do ocupante do imóvel excutido, mesmo se houver locação, e à obrigação do fiduciante em arcar com taxa de ocupação e com as despesas vinculadas ao imóvel até a desocupação, conforme os §§ 7º e 8º do art. 27 e os arts. 30 e 37-A da Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, equiparada a data de consolidação da propriedade na execução da alienação fiduciária à data da expedição da ata notarial de arrematação ou, se for o caso, do registro da apropriação definitiva do bem pelo credor hipotecário no registro de imóveis”. Ricardo Martins Presidente do Conselho de Administração do RIB

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